Afinal: o que está em jogo na Campanha Nacional da Categoria Bancária?

A categoria bancária vem passando por inúmeras transformações que são desafiadoras para negociações. Um dos principais pontos diz respeito às alterações previstas na reforma trabalhista, que colocam em risco diversos direitos conquistados ao longo de 30 anos de nossa Convenção Coletiva de Trabalho. Com a reforma, não temos mais a ultratividade, que garantia os direitos até que a negociação fosse concluída. Em função disso, iniciamos todo o processo com muita antecedência. Porém, é de interesse dos bancos arrastar o processo até próximo da data limite, sempre reivindicamos assinatura do pré-acordo buscando ter mais tranquilidade para conduzir as negociações. Entretanto, uma negociação é uma via de mão dupla e impossível de implementar uma dinâmica sem que a outra parte concorde. Essa nova realidade impõe limites ao processo negocial, expondo ao movimento sindical inúmeros desafios: a proposta precisa ser encaminhada até a data-base, 1º de setembro, sob pena de colocar em risco os direitos previstos na Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) e acordos específicos. Sob esse aspecto, vale ressaltar que 85% das cláusulas acordadas na CCT estão acima do previsto em lei, como complemento salarial em caso de afastamentos, estabilidade de pré-aposentadoria, auxílios creche/babá, abono de dias para troca de prótese e acompanhamento de filhos com deficiência, auxílio para pais com filhos/as PCDs, entre tantos outros.

Além disso, direitos que sequer existem na legislação como proteção à bancária vítima de violência doméstica, que permite realocação e uma linha de crédito diferenciada; assim como, assistência médica a casais homoafetivos.

Nessa nova CCT, à luz dos desafios da crise climática, há previsão da criação de uma comissão para dar encaminhamentos as bancárias e bancários em regiões atingidas por desastres ambientais.

Compreendemos a insatisfação com um índice de reajuste. Sim: ao analisarmos os dados dos bancos, notamos que a lucratividade é bem maior, porém a proporcionalidade a esse fator é um desafio, especialmente quando verificamos o uso de novas ferramentas tecnológicas que possibilitam o trabalho em qualquer lugar, dificultando a organização para um movimento de enfrentamento.

Vi diversos ataques aos sindicatos e dirigentes, algo inaceitável e desrespeitoso. Muitos desses, com discurso divisionista, reproduzindo inclusive o discurso dos bancos, como se isso fosse capaz de alterar o resultado de uma negociação que reúne mais de 170 bancos entre pequenos, médios e grandes e garante diretos a cerca de 430 mil bancários e bancárias de norte a sul do país.

Foram treze rodadas de negociação difíceis, algumas com mais de 20 horas. Algo inimaginável para quem não vive essa realidade. Negociamos com quem tem muito poder político e econômico, sabemos que a reforma trabalhista foi muito bem trabalhada pelos banqueiros para sua aprovação. Ouvimos absurdos com comparações entre o salário dos bancários e os de mercado, quando os representantes dos banqueiros tentavam, a todo momento, dividir a categoria, impor perdas e retirar direitos.

Alguns me perguntam: a categoria vai acabar? Observamos o fechamento de agências, o direcionamento para atendimento digital, demissões em massa praticadas pelos bancos privados. Apesar disso, a minha resposta é: não. A categoria está se deslocando para o trabalho precário. Os bancos, todos eles, estão se utilizando da nova legislação para atuar em plataformas digitais onde o/a trabalhador/a, assim como o/a motorista do Uber, paga para trabalhar ao acessar a plataforma, assumindo todos os custos e riscos do exercício profissional. A terceirização, que já está sendo realizada por parte dos bancos, visa reduzir direitos e tirar a representação da categoria.

E para responder à pergunta inicial, “o que está em jogo na campanha nacional?”, respondemos que é a unidade da categoria, a manutenção dos direitos nos bancos públicos e privados. Sim, porque é óbvio que os bancos públicos também estão se utilizando da tecnologia e da lei para reduzir custos.

Precisamos discutir formas de combater a precariedade do trabalho bancário e ampliar direitos para parcela que trabalha para instituições financeiras sem direitos como: plano de saúde, auxílios refeição e alimentação; PLR, complemento salarial em caso de afastamento, INSS, férias…profissionais que são intitulados como “agentes autônomos” ou “personal bankers”, nomes pomposos adotados em referência a trabalhadores/as seduzidos/as pelo discurso de que ele/ela é dono/a do seu tempo. Sabemos que essa não é a realidade.

Além disso, é necessário discutir qual sistema financeiro defendemos, sua regulação e sobretudo a quem tem servido o atual modelo. Quando observamos as alterações feitas pelo Banco Central no governo anterior sob a alegação de “liberdade econômica” notamos a fragilidade de uma regulação que pode causar prejuízos à sociedade e ao Estado brasileiro.

Basta um breve olhar na rentabilidade de bancos como Nubank, que passou à frente de gigantes do setor como o Itaú, por exemplo. São instituições que não contam com agências físicas de atendimento e não têm que cumprir as regras de um banco, porque de acordo com sua classificação e a “liberdade econômica” são instituições de pagamentos, fintechs, financeiras, entre tantas outras nomenclaturas. Uma realidade que traz insegurança para clientes. Afinal, se um banco desse quebrar, quem paga a conta? O cliente procurará quem? Onde?

Tratei aqui dos debates que são da sociedade para dizer que os bancários e bancárias têm resistido e enfrentado muitos desafios. E a maioria do movimento sindical bancário tem efetivamente, e de forma responsável, exposto sua opinião. Quando defendemos uma proposta, não olhamos apenas para determinado segmento e sim para o conjunto dos/as trabalhadores/as, assumindo a responsabilidade que temos ao liderar qualquer movimento.

Ouvi muitos falarem em greve, o que é um direito do/a trabalhador/a, mas será que com todos esses desafios há mobilização suficiente para garantir direitos?

Vale lembrar que a aprovação da proposta não representa o fim da luta. Ao contrário. Esse é um processo contínuo, com o qual temos compromisso profundo. Precisamos seguir construindo a mobilização que multiplique nossa capacidade de luta. Para isso, precisamos de cada um e cada uma. Contamos com você.

Adriana Nalesso, presidenta da FEDERA-RJ

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